quinta-feira, 9 de outubro de 2008

A MUDANÇA


Olha bem esse cara falando e veja se você não reconhece alguém, algum fato, algo parecido do qual já ouviu falar por ai. É apenas o retrato da vida, do cotidiano de um Rio de Janeiro que é habitado por todo tipo de gente:

-Pois é, vim do norte esse minino e cheguei aqui fui ficando na casa duns parente, lá na Rocinha. Era eu a muié e dois fio. Custei a arruma um imprêgo, mas acabei indo trabaiá de faxinero, num prédio do Catete. Foi bom demais. Com dois anos eu já pude aluga um barraco lá na Rocinha.

Esse aí é o Flaviano. Uma figura doce, sempre solicita, sempre pronto a ajudar, principalmente a quem lhe dá uns trocados. Como gosta de uns trocados ele. Sempre conservando seu jeitão do inteior e uma certa ingenuidade que ainda existe, acredite. E continua:

-Dispois de aluga meu barraco, butei na cabeça que tinha que comprá ele. E assim cumecei a trabaiá mais e mais. Inquanto fazia dobra nu sirviço, meu irmão que mora lá tombem, começou a ficar lá em casa. E num é que o disgraçado cumeu minha muié. Virei corno. Oh mô Deuso, qui tristeza...

Coitado do cara, não é mesmo? Mas o drama para quem tem pouco não pode se alongar e assim...

-Mas eu já tava com quatro fio. O que qui eu ia fazer? Ia deixa meus fio longe não. Deixei a muié ficá. Ela prumeteu que num ia fazer mais aquilo e o puto du meu irmão vortô pru norte. O perigo agora era us otro Paraíba da favela. Mas fui levano até comprá o barraco, num sabe?!...

-Seu moço, minha vida é compricada porque tenhu que leva os fio pra iscola pubrica e depois que vou pru trabaio. As prufessora chama pru modi avisa que os garoto tão fazendo bagunça mas eu num tenho tempo de ir lá. Mas agora us traficanti tão dano tanto tiru na Rocinha que eu acho que vô sai de lá. Já inté arrumei quem compra meu barraco. Vô mudar pru morro da Santo Amaro no Catete, porque lá é mais perto du sirviço. Eu num vô aluga purque eu quero ter minha casa pópa (leia-se casa própria).

Como o cara começa a contar sua vida, detalhando fatos, não custa perguntar:

-Mas Flaviano, e sua mulher, aquele negócio que ela teve com seu irmão não pode acontecer com outro cara?

-A muié inté qui ta calma. Inté foi ela qui arrumou esse barraco no Catete com o ¨Pé de Mesa¨, um cara gente boa que diz que manda por lá. Domingo passado ele inté passô u dia lá em casa. Jogamu uma suéca e dispois fui trabaiá, inquanto ele fico discutindo com ela as coisa da mudança. Legal ele...

E assim segue a vida do Flaviano, um paraibano a mais nesse Rio de Janeiro violento, triste e cheio de histórias.

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