domingo, 1 de abril de 2012
ESQUENTANDO CORAÇÕES
Eu não consigo entender a TV brasileira. Enquanto se arrasta claudicando na audiência algo tão decadente e enfadonho como o tal “Domingão do Faustão”, a Globo descarta um programa como o “Esquenta”, apresentado por Regina Casé, que sai do ar inexplicavelmente para só voltar em junho. Se estivesse no lugar do ex-gordo, o “Esquenta” certamente estaria estourando em números e apavorando a concorrência.
Regina Casé conseguiu fazer uma salada cultural com forte cheiro de povo, com a evidência que podemos buscar nos recônditos expressões artísticas de valor, mostrando ao Brasil e ao mundo que a nossa cara não é a que tentam maquiar nas novelas. No “Esquenta” está o retrato de nossa gente ao vivo e a cores, dando vazão a capacidade que o brasileiro comum tem de produzir culturalmente.
Tudo isso só prova o que tenho dito constantemente que somos um país hipócrita, que vira as costas para a realidade que temos. Não adianta querer mostrar a realidade do Rio de Janeiro focalizando tão somente o que acontece nos condomínios da Zona Sul. Essa realidade não retrata o que somos. O Rio tem, infelizmente, uma multidão segregada nas favelas, nas comunidades de baixa renda, onde também existem e convivem o bem e o mal, igualzinho na nata da sociedade.
Lá nos guetos há também aqueles que tem o dom de cantar, de tocar algum instrumento, de produzir textos, de pintar e vai por aí afora. Resta apenas dar a estes uma oportunidade de mostrar esse talento. O “Esquenta” da Regina Casé serve como ponte para mostrar tudo isso e quando se consolida como um programa respeitável, vai lá algum ser de outra galáxia e dita a norma que tem que sair do ar porque o Brasil precisa continuar a ser hipócrita.
Tal qual esse fracassado BBB que assistimos, o “Esquenta” é mais uma demonstração dos erros que são cometidos por quem quer impor aquilo que temos que ver na TV. E convenhamos que depois de tantos anos continuar a ver a figura desse Faustão nas tardes de domingo é um suplício que atormenta quem tem TV aberta somente e não pode pagar TV a cabo, Sky ou assemelhadas.
Quando vi hoje que o “esquenta” estava se despedindo com o mote de enaltecer a figura do amigo e que só voltará em junho para focalizar as festas da época acabei entendendo o quanto é absurda a covardia que é praticada contra quem assiste TV e transforma isso no seu programa preferido de domingo.
O povo vive um pouco da emoção. Isso movimenta, traz esperança, embala os sonhos de quem luta diuturnamente. Todos querem um pouquinho desse doce sabor de magia que a realidade do nosso quotidiano pode gerar em termos de alegria, competência. E retirar o “Esquenta” do ar foi como tirar das mãos de uma criança a bala que ela quis ganhar durante a semana inteira e conseguiu.
Quem faz a nossa TV precisa acordar um pouco para a realidade do país em que vive. Falsidade pouca para essa gente parece ser bobagem. Eles querem mostrar os salões luxuosos que a maioria esmagadora do povo não vê e não consegue chegar lá. Eles querem mostrar o enredos inebriantes em programas de alto luxo quando nossa cultura verdadeiro é da pinga com um tira gosto na barraca da esquina. Um chopp ou uma cervejinha já é quase um luxo, principalmente por sabermos que os impostos contidos nessas bebidas são tão escorchantes quanto os dos cigarros. É quase tudo para o governo e saindo de nossos bolsos.
Por isso que acho que precisamos ser mais realistas e verdadeiros com a nossa gente. O “Esquenta” mostra um pouco disso com alegria e faz desse povo humilde as estrelas que normalmente eles não querem mostrar. Isso “Esquenta” um pouquinho mais o coração da nossa gente porque alí está a realidade que vemos nas esquinas, nos bairros, diferente daquilo que tentam nos mostrar.
Mais uma vez a vergonha da TV brasileira aberta se faz sentir, se materializa com o primor de uma decisão de algum executivo empertigado, que do alto de seu poder global é capaz de perpetrar mais uma covardia contra seu próprio público. Tirar do ar o “Esquenta” é tirar um pouco da emoção que embala nossa gente. Uma banana para esse trouxa, de preferencia podre.